quinta-feira, 15 de dezembro de 2011

Alta na desigualdade tira US$ 740 bi dos trabalhadores americanos

Por Robin Harding

Financial Times – VALOR

Foi tão intensa a sensação de Jonathan Smucker de que alguma coisa estava errada no cerne do sistema americano que ele deixou a pequena empresa que administrava, em Rhode Island, e foi para Nova York para participar da manifestação Ocupem Wall Street.



“Assim como muitos americanos, estou bem revoltado. Não por existirem pessoas ricas, mas porque as pessoas com muito dinheiro manipularam o sistema de tal forma nas últimas décadas que não existe mais igualdade de oportunidades para todos”, disse ele nos protestos da semana passada.



“Somos os 99%”, diz o slogan do movimento Ocupem Wall Street, em referência à crescente riqueza do 1% que ocupa o topo da pirâmide da distribuição de renda nos Estados Unidos. Mas um slogan igualmente válido poderia ser: “Recebemos 58%.”



Esse percentual é a parte da renda nacional americana recebida pelos trabalhadores, sob a forma de salários, em contraposição à renda dos investidores, embolsada sob a forma de lucros e juros. Essa parcela caiu para seu nível mais baixo desde o início da série histórica, após a Segunda Guerra Mundial, e é parte do motivo pelo qual a renda do segmento mais elevado de 1% – que tende a provir de investimentos de capital – subiu tanto.



Se os salários atuais mantivessem sua participação média do pós-guerra, de 63%, os trabalhadores estariam ganhando US$ 740 bilhões a mais este ano, cerca de US$ 5 mil por trabalhador, segundo cálculos do “Financial Times”.



Essa chamada participação do trabalho na renda nacional vem passando por uma leve queda na maioria das economias industrializadas, mas principalmente nas economias anglo-saxônicas, nas últimas décadas. Nesta recuperação, no entanto, está ocorrendo uma coisa estranha e sem precedentes. “As margens de lucro não apenas estão muito altas atualmente como o comportamento [das empresas] anda muito fora do comum”, disse Andrew Smithers, que administra a consultoria Smithers & Co. de Londres. As margens de lucro e os retornos sobre o capital são o outro lado da moeda da participação do trabalho.



Historicamente, a participação do trabalho tende a subir durante as recessões, uma vez que as empresas seguram os funcionários e sacrificam os lucros, e torna a cair na recuperação. Mas, durante a recessão de 2008, ocorreu o contrário com a participação do trabalho: ela caiu, e, quando se instaurou a recuperação, continuou caindo.



“O que é absolutamente notável é que os lucros do setor corporativo estão de 25 a 30% maiores do que antes da recessão, embora haja significativa parcela da capacidade instalada sem utilização e alta taxa de desemprego”, afirmou Lawrence Mishel, presidente do Instituto de Política Econômica, situado mais à esquerda do espectro político e sediado em Washington.



A queda da participação dos salários, aliada à transferência da renda do trabalho para os estratos de maiores salários, pode ser uma parte importante do motivo pelo qual a recuperação econômica dos EUA tem se mostrado anêmica.



Os trabalhadores de salários mais baixos consomem boa parte de sua renda, enquanto os que ganham mais e as pessoas cuja renda provém de ganhos de capital têm maior tendência a poupar. Isso não afetará a demanda total somente se os poupadores emprestarem para os que querem consumir ou investir em construções e em empresas iniciantes

Fonte : Valor Economico 15/11/2011

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